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19.6.11

O homem de paletó e bons sapatos

O homem de paletó e bons sapatos faz barulho.
Sua mão treinada busca latas no fundo da lixeira amarela. 
Uma após a outra. Conquistas vazias, sem nenhuma expressão de vitória, satisfação ou insatisfação.
Vira no chão o resto de coca-cola, que é nada.
Descarta um canudo, que é nada.
Fica só com a moeda de troca.
As abelhas não o estorvam.


Mesmo havendo outras lixeiras, o homem de paletó e bons sapatos procura somente nessa.
Será que ele lê? 
E vai atrás somente da palavra "metal"
Ou talvez saiba que a cor amarela nos cestos de lixo significa "metal".
Será que sabe o que é "metal"?
Ou só está condicionado a compreender que, por algum hábito estranho, as pessoas jogam latas sempre naquela lixeira da ponta direita?


O homem de paletó e bons sapatos (talvez não tão bons, se você olhar bem) caminha de uma lixeira para outra. No caminho espia de soslaio um cesto de lixo avulso, preto, e nada encontra.
"Bem treinada essa gente", talvez ele pense, "só joga latas em cestas amarelas"
O que facilita o trabalho do homem de paletó e bons sapatos.


Ele passa na minha frente. Sacola branca nas mãos, resoluto, paletó e corpo surrados.
Vai embora.
Vai fazer pão de lata.
O que o faz ser homem?